Redatora
Publicado em 11 de junho de 2025 às 08h24.
A desdolarização voltou ao centro do debate econômico global, com a Ásia liderando uma transição gradual no uso do dólar em transações comerciais, investimentos e reservas cambiais.
Impulsionados por incertezas geopolíticas, volatilidade cambial e estratégias de proteção, países do continente estão intensificando o uso de moedas locais. O movimento que, embora ainda longe de desbancar a hegemonia do dólar, começa a ganhar força estrutural.
A Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) incorporou no plano estratégico da Comunidade Econômica para 2026-2030 o compromisso de ampliar os pagamentos em moedas locais no comércio regional. A meta é reduzir a exposição a choques cambiais e fortalecer a integração dos sistemas de pagamentos entre os países-membros.
A pressão por essa mudança também vem do cenário global. A participação do dólar nas reservas cambiais caiu de mais de 70% em 2000 para 57,8% em 2024, segundo dados oficiais.
O índice do dólar, que mede seu desempenho frente a outras moedas, acumula queda de mais de 8% desde o início do ano, refletindo a instabilidade causada, entre outros fatores, pelas decisões comerciais do presidente Donald Trump.
"Os países estão revendo suas carteiras em dólar diante do uso estratégico da moeda em negociações, tarifas e sanções", disse Mitul Kotecha, estrategista do Barclays, em entrevista à CNBC. Essa percepção tem levado a uma reavaliação global do papel do dólar como ativo seguro.
Segundo o Bank of America, o movimento de desdolarização na ASEAN deve se intensificar nos próximos trimestres, impulsionado pela conversão de depósitos em dólar para moedas locais e pela atuação de grandes investidores que buscam se proteger da volatilidade. Japão, Coreia do Sul, Taiwan e China, por exemplo, detêm grandes volumes de ativos no exterior e são os que mais avançam no uso de moedas próprias.
No mercado financeiro, o hedge cambial também ganha relevância. Gestoras e fundos de pensão da Ásia estão aumentando sua proteção contra variações do dólar, vendendo a moeda americana e comprando iene, won ou dólar taiwanês.
Apesar da crescente diversificação, especialistas ponderam que a dominância do dólar ainda está longe de ser ameaçada. No comércio global, mais da metade das transações ainda é feita em dólar e sua liquidez, profundidade de mercado e aceitação mundial seguem incomparáveis.
"A desdolarização é real, mas lenta", afirmou Peter Kinsella, estrategista do Union Bancaire Privée. Para ele, o principal beneficiado desse reposicionamento gradual pode ser o ouro, que cresce como reserva alternativa em meio à transição.